sábado, 31 de julho de 2010

Conto

Precisava de respirar. Abriu a janela e tentou farejar na linha do horizonte o lugar onde queria estar. Queria teletransportar-se para qualquer sítio no mundo onde pudesse sentir-se em casa. Era uma sensação interessante: a "inquietude" de não saber onde se deve estar, mas ter a certeza de que algures no mundo existe um lugar para nós.
Era assim que ele se sentia. Sentia-se sozinho; deslocado. Mas, mesmo assim, era feliz.
Com 32 anos, tinha aprendido que a única certeza que tinha era que só podia contar consigo próprio.
Não tinha família. Os pais tinham morrido quando ainda era uma criança. Foi viver com os avós mas a idade não perdoa e também os perdeu quando tinha 20 anos. E, desde essa altura, vivia sozinho. E não pensava na perda. Bem, talvez só de vez em quando, naqueles dias em que a saudade volta e as recordações e todos os bons momentos batem à porta da nossa cabeça. Mas, ao contrário do que possa parecer, ele não era alguém frio: a razão de não pensar muito na sua família era simples: na realidade, nunca tinha conhecido os pais. Era demasiado novo quando morreram. Era ainda um bebé. Talvez não pudesse dizer que os amava. A verdade "cruel" é que amamos apenas aquilo que conhecemos. É claro que amava os avós. Mas quando morreram, já com 80 anos, sabia que a morte é inevitável quando já se viveu tudo o que havia para viver. E conformou-se. Parece difícil de compreender. Mas para ele parecia apenas lógico. (...)

1 comentário:

Ana Maria Cameselle disse...

Tânia, belo texto, sem dúvida! há algo que gostaria de dizer-te, mas não me parece bem que seja neste espaço. Vou enviar-te um mail. É um segredo!